A escuta e o silêncio: a história de Laura – Terapia em Filosofia Clínica (4ª ed.)

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A escuta e o silêncio: a história de Laura – Terapia em Filosofia Clínica (4ª ed.)

GOYA, Will. A escuta e o silêncio: a história de Laura – Terapia em Filosofia Clínica. 4. ed. Porto Alegre: Editora Mikelis, 2020. 268p (ISBN 978-85-93458-70-5).

DISPONÍVEL em versão impressa e digital: http://editoramikelis.com

 

APRESENTAÇÃO

 

Pierre Weil

Um dos maiores psicólogos e educadores do século XX. Autor de mais de 40 livros traduzidos em várias línguas

 

É com muito prazer que introduzo para o público a presente obra de Will Goya: A escuta e o silêncio, sobretudo porque se trata de uma pessoa cuja vocação para a psicoterapia se declarou muito cedo, a ponto de aos 18 anos já estar em Brasília, fazendo conosco a formação da nossa UNIPAZ, com um razoável conhecimento de todos os grandes pioneiros da psicoterapia moderna.

O título do livro é bastante sugestivo da sua prática terapêutica, como ele a descreve, com uma poderosa força de compaixão. Ele sabe transformar-se em ouvido atento, não somente ao conteúdo da fala, mas também às muitas linguagens não-verbais, nas suas diferentes expressões fenomenológicas.

Com certeza este livro de filosofia constitui uma grande contribuição à psicologia e a todos que atualmente procuram cuidar do Ser.

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PREFÁCIO

Lúcio Packter

Sistematizador da Filosofia ClÍnica no Brasil

 

Em A Lingua Absolvida, Elias Canetti conta de sua historicidade: “entre si, meus pais falavam alemão, do que eu nada devia entender. Conosco, os filhos, e com todos os parentes e amigos, falavam em ladino. Essa era, afinal, a língua corrente, aliás um castelhano antigo, que também mais tarde ouvi com frequência e jamais esqueci. As meninas camponesas que ficavam em nossa casa só falavam búlgaro, e com certeza foi com elas, principalmente, que eu o aprendi. Mas como jamais frequentei uma escola búlgara, e abandonei Ruschuk com seis anos, em breve o esqueci completamente. Todos os acontecimentos daqueles primeiros anos se desenrolaram em ladino ou búlgaro. Mais tarde se traduziram, em grande parte, para o alemão”.

Elias Canetti nos diz que os contos búlgaros e outros relatos ele registrou e trouxe na língua alemã. Ele não sabe o que houve, não sabe quando esta tradução se realizou e de que modo isso ocorreu. O escritor admitiu que temia que uma análise exigente do assunto colocasse a perder as lembranças caras. Peculiarmente as recordações íntimas e tocantes estão agora agendadas em Elias Canetti por palavras que naquela ocasião ele não conhecia. Ao tratar delas escrevendo em alemão, ele não considera que esteja cometendo algum dano, alguma alteração ao conteúdo.

Uma das possibilidades de entendimento, de aproximação, de acolhimento ao que Elias Canetti escreveu, a complexidades como esta que ele apresentou, é esta obra revista e ampliada, de Will Goya. Nas falas do silêncio, nos contrastes da ausência, nos silêncios dos sons, na alma que se desenvolve na vida, o filósofo nos mostra possibilidades de caminhos.

Sou agradecido pelos telefonemas que recebi de Will nos quais ele me questionava, comentava, exclamava sobre alguns temas tratados neste livro.

Uma obra poética, filosófica, técnica, um texto para abrir horizontes de reflexões filosófico clínicas.

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NOTA DO AUTOR

 

Há quase dez anos atrás escrevi este pequeno livro enquanto morava em São Francisco, Califórnia-EUA. Sentia-me oprimido por não conseguir filosofar em inglês com a fluência linguística que o meu coração exigia de mim. Desejava apresentar ao povo americano o que é a Filosofia Clínica. Pensei em uma futura tradução, após eu escrever na minha língua natal, entretanto, outra comunicação, mais bela e sutil aconteceu em minha alma. Praticamente em toda a obra – com a exceção do caso Laura e do uso dos termos técnicos – não houve tempo de eu pensar nas frases mais adequadas. Antes eu as ouvia quase que por inteiro, de chofre, enquanto trabalhava. Foram cerca de três meses interrompendo minhas atividades diárias com várias anotações em minha agenda de bolso.

O livro nasceu da escuta e para o exercício da escuta. Inspirado pelo mais Alto e escrito pelas minhas mãos, trata-se de uma pobre tradução das grandezas do inefável. Só o chamo de “meu” pela absoluta impropriedade de conferir ao livro outro nome – que não sei qual – para a autoria. Enquanto filósofo clínico e poeta, ainda hoje, sinto com alegria e gratidão a oportunidade de eu ser em todo caso uma pessoa “melhor do que nada”.

Nesta quarta edição, de certa maneira posso afirmar que este é um novo livro. Por fim, já com o olhar distanciado das premências e dificuldades naturais das revisões anteriores, tive fôlego existencial para realizar inestimáveis ajustes, relendo cautelosamente todo o livro várias e várias vezes. Minha alma insatisfeita necessitava disso para seguir a diante. Com calma reflexiva, serenidade concentrada e amadurecimento filosófico, corrigi desde questões gramaticais básicas, refinando conceitos, até o ponto de ter que refazer capítulos inteiros, acrescentando outros, inserindo trechos e notas de rodapé. Imprecisões que uma vez retificadas, comparativamente, fazem concluir sobre a presente edição um trabalho ímpar. Sem mudanças no eixo teórico do livro, ele está agora exatamente tal como eu gostaria que tivesse sido desde a sua primeira publicação. Rigorosamente melhor, afinado. Devo essa gigantesca tarefa ao profundo respeito e amor que levo comigo por aqueles que também amam e estudam a Filosofia Clínica.

Essencialmente um filósofo clínico, reitero minha gratidão imortal ao gentil amigo Lúcio, companheiro de muitos anos de jornada, pela chance deste livro ser – se puder ser – útil a alguém. Sem fronteiras territoriais, com o mesmo céu em toda a Terra, basta-me abrir a janela para ser vizinho de Fernando Pessoa. Com as nuvens por testemunhas, a atmosfera que percorre nossas casas é a mesma em todo o planeta. O que nos separa é tão só uma difícil janela fechada. Porém, quando acontece de eu desterritorializar-me dos apegos identitários, em minha alma uma janela se abre para a total liberdade humilde de eu ser outro e para os outros. Porque vizinhos de janela, eu (apesar de mim) posso ouvi-lo em meus próprios pensamentos: “Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo…”.